domingo, 8 de abril de 2007

Sobre as Tentações de Jesus

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Faço uma observação: Orígenes é bastante respeitado, mas sua Teologia e exposição da doutrina Cristã são muito criticadas em alguns pontos, como a idéia de que todos iriam se salvar na consumação dos tempos, cujo nome é apocatástase. Essa noção absurda seria retomada, numa versão moderna, por Kant. Em primeriro lugar, Orígenes foi aluno de Amônio, que também deu aulas a Plotino. Este era um polemista antignóstico, mas tendo ele próprio traços gnósticos em sua filosofia (o neoplatonismo). Além disso, declarava que um dos principais objetivos de sua escola era refutar o Cristianismo.

Voltando a Orígenes, neste texto mesmo há um equívoco: o diabo não é o inimigo de Deus. Como diz Alvaro Velloso de Carvalho,
Sempre vale lembrar que o diabo não é, de forma alguma, o inimigo de Deus, porque se isso fosse possível o próprio conceito de Deus perderia sentido e a própria existência do universo seria impossível, porque haveria uma força criadora e uma força destruidora, ambas com o mesmo poder.

O diabo não é inimigo de Deus; é um inimigo do homem, é a força que tenta levar o homem a perder sua alma - e, assim sendo, atua como instrumento divino, porque a tentação, quando vencida, é uma via de salvação. Leiam o Livro de Jó e saberão exatamente do que estou falando.

Procure interpretar a riqueza da expressão de Orígenes, notar suas contradições para dizer quais são aparentes e quais efetivas... e boa leitura!

Homilias sobre o Cântico dos Cânticos, de Orígenes, presbítero do século II.

A vida dos mortais está cheia de laços de escândalos e de redes de ilusões, armadas contra o gênero humano por aquele gigante caçador, inimigo do Senhor, que é chamado Nemrod. Quem é esse verdadeiro gigante senão o demônio, que se revolta contra o próprio Deus? Os laços das tentações e as armadilhas das insídias são, pois, chamadas redes do demônio. E porque o inimigo estendera essas redes em toda parte e apanhara quase todos, tornou-se necessário que aparecesse alguém mais forte e poderoso, que as pudesse romper e abrir o caminho para aqueles que o seguiam.

Eis porque o Salvador, antes de se unir à Igreja como Esposo, é tentado pelo demônio, para que, vencendo pela tentação as redes das tentações, olhasse e chamasse a si a Igreja, ensinando-lhe e mostrando-lhe que não se chega a Cristo pelo ócio e pelas delícias, mas por meio de muitas tribulações e tentações. Não havia, com efeito, outro que pudesse superar essas redes. Pois todos, como está escrito, pecaram (Rm 3,23); e de novo, como diz a Escritura: Não há nenhum justo sobre a terra, que faça o bem sem jamais pecar (Ecl 7,20); e ainda: “Ninguém está isento de pecado, nem mesmo se sua vida tiver durando um só dia”.

Somente Jesus, nosso Senhor e Salvador, não pecou; mas o Pai o fez pecado por nós (2Cor 5,21), enviando-o numa condição semelhante àquela da humanidade pecadora para, justamente por causa do pecado, condenar o pecado em nossa condição humana (cf. Rm 8,3). Entrou, pois, naquelas redes, mas foi o único que não pôde ser envolvido por elas; pelo contrário, tendo-as rompido e reduzido a pedaços, faz com que sua Igreja confie, para que ouse doravante romper os laços e ultrapassar as redes, dizendo com toda alegria: Nossa alma como um pássaro escapou do laço que lhe armara o caçador; rompeu-se o laço, e assim nós conseguimos libertar-nos (Sl 123/124,7).

Quem, pois, rompeu o laço senão o único que não podia permanecer prisioneiro? Embora tenha morrido, foi voluntariamente que morreu, e não como nós, por causa do pecado. Só ele foi livre entre os mortos. E, porque só ele foi livre entre os mortos, tendo vencido quem tinha o poder da morte, libertou os cativos que estavam retidos pela morte. Não só ressuscitou a si mesmo dos mortos, mas também despertou, ao mesmo tempo, os que estavam prisioneiros da morte, introduzindo-os nos céus. Subindo, pois, ao alto, levou consigo os cativos, não libertando apenas as almas, mas ressuscitando também os seus corpos, conforme atesta o Evangelho: Os corpos de muitos santos ressuscitaram e apareceram a muitos, e entraram na cidade santa do Deus vivo, Jerusalém (cf. Mt 27, 52.53).

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