quinta-feira, 12 de abril de 2007

A Permanente Defesa da Vida

Fonte

7. E no decorrer da história, os Padres da Igreja, bem como os seus Pastores e os seus Doutores, ensinaram a mesma doutrina, sem que as diferentes opiniões acerca do momento da infusão da alma espiritual tenham introduzido uma dúvida sobre a ilegitimidade do aborto. É certo que, na altura da Idade Média em que era opinião geral não estar a alma espiritual presente no corpo senão passadas as primeiras semanas, se fazia uma distinção quanto à espécie do pecado e à gravidade das sanções penais. Excelentes autores houve que admitiram, para esse primeiro período, soluções casuísticas mais suaves do que aquelas que eles davam para o concernente aos períodos seguintes da gravidez. Mas, jamais se negou, mesmo então, que o aborto provocado, mesmo nos primeiros dias da concepção fosse objectivamente falta grave. Uma tal condenação foi de facto unânime. De entre os muitos documentos, bastará recordar apenas alguns. Assim: o primeiro Concílio de Mogúncia, em 847, confirma as penas estabelecidas por Concílios precedentes contra o aborto; e determina que seja imposta a penitência mais rigorosa às mulheres « que matarem as suas crianças ou que provocarem a eliminação do fruto concebido no próprio seio » [9] . O Decreto de Graciano refere estas palavras do Papa Estêvão V: « É homicida aquele que fizer perecer, mediante o aborto, o que tinha sido concebido »[10] . Santo Tomás, Doutor comum da Igreja, ensina que o aborto é um pecado grave contrário à lei natural [11] . Nos tempos da Renascença, o Papa Sisto V condena o aborto com a maior severidade [12] . Um século mais tarde, Inocêncio XI reprova as proposições de alguns canonistas « laxistas », que pretendiam desculpar o aborto provocado antes do momento em que certos autores fixavam dar-se a animação espiritual do novo ser [13] Nos nossos dias, os últimos Pontífices Romanos proclamaram, com a maior clareza, a mesma doutrina. Assim: Pio XI respondeu explicitamente às mais graves objecções;[14] Pio XII excluiu claramente todo e qualquer aborto directo, ou seja, aquele que é intentado como um fim ou como um meio para o fim;[15] João XXIII recordou o ensinamento dos Padres sobre o carácter sagrado da vida, « a qual, desde o seu início, exige a acção de Deus criador » [16] . E bem recentemente, ainda, o II Concílio do Vaticano, presidido pelo Santo Padre Paulo VI, condenou muito severamente o aborto: « A vida deve ser defendida com extremos cuidados, desde a concepção: o aborto e o infanticídio são crimes abomináveis » [17] . O mesmo Santo Padre Paulo VI, ao falar, por diversas vezes, deste assunto, não teve receio de declarar que a doutrina da Igreja « não mudou; e mais, que ela é imutável »[18] .

[9] Cânon 21 (MANSI, 14, p. 909). Cfr. o Concílio de Elvira, cânon 63 (MANSI, 2, p. 16) e o Concílio de Ancira, cânon 21 (ibid., p. 519). Poder-se-á ver também o decreto de Gregório III, respeitante à penitência a impor àqueles que porventura se tornaram culpados deste crime (MANSI, 12, 292, c. 17).

[10] GRACIANO, Concordantia discordantium canonum, C, 2, q. 5, c. 20. Durante a Idade Média recorria-se frequentemente à autoridade de Santo Agostinho, o qual escreveu a este propósito, na sua obra De nuptiis et concupiscentiis, c. 15: « Por vezes esta crueldade libidinosa, ou esta libidinagem cruel vão até ao ponto de arranjarem venenos que tornam as pessoas estéreis. E se o resultado desejado não é alcançado desse modo, a mãe extingue a vida e expele o feto que estava nas suas entranhas; de tal maneira que o filho morre antes de ter vivido; de sorte que, se o filho já vivia no seio materno, ele é matado antes de nascer (P.L. 44, 423-424: CSEL 42, 230. Cfr. o Decreto de Graciano, o. c., C. 32, q. 2, c. 7).

[11] Comentário sobre as Sentenças, livro IV, dist. 31, na exposição do texto.

[12] Constitutio Effraenatum, de 1588 (Bullarium Romanum, V, 1, pp. 25-27; Fontes Iuris Canonici, I, n. 165, pp. 308-311).

[13] DENZ-SCHÖN., 1184. Cfr. também a Constituição Apostolicae Sedis de Pio IX (Acta Pii IX, V, pp. 55-72; em A.S.S. 5 [1869], pp. 287-312; e em Fontes Iuris Canonici, III, n. 552, pp. 24-31).

[14] Encíclica Casti connubii: A.A.S. 22 (1930), pp. 562-565; DENZ-SCHÖN., 3719-21 (2242-2244).

[15] As declarações de Pio XII são explícitas, precisas e numerosas; essas declarações exigiriam, por si sós, um estudo aturado. Citamos apenas — porque aí se formula o princípio em toda a sua universalidade — o Discurso dirigido à União Italiana Médico-Biológica « São Lucas », em 12 de Novembro de 1944: « Até ao momento em que um homem não se tornar culpado, a sua vida é intocável; e por isso é ilícito todo e qualquer acto que tenda directamente para destruí-la, quer essa destruição seja intentada como fim, ou somente como meio para o fim, quer se trate de uma vida no seu estado embrionário ou já no seu desenvolvimento pleno ou, ainda, prestes a chegar ao seu termo » (Discorsi e radiomessaggi, VI, p. 191).

[16] Encíclica Mater et Magistra: A.A.S. 53 (1961), p. 447.

[17] Const. Gaudium et spes, n. 51; cfr. também n. 27 (A.A.S. 58 [1966], p. 1072; e cfr. 1047).

[18] Alocução Salutiamo con paterna effusione, de 9 de Dezembro de 1972: A.A.S. 64 (1972), p. 777. Dentre os testemunhos desta doutrina imutável, recorde-se a declaração do Santo Ofício, que condena o aborto directo (A.S.S. 17 [1884], p. 556; 22 [1888-1890], p. 748; DENZ-SCHÖN. 3258, [1890]).

Excerto da Declaração sobre o Aborto Provocado, da Congregação para a Defesa da Fé.


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