Fui entrando nisso aos poucos, à medida que a experiência me revelava minha ignorância e ia me instilando a revolta contra o torpor e a indolência mentais que me aprisionavam num mundo de vulgaridade obscura e sem esperança. Cinco experiências foram marcantes, sob esse aspecto. A primeira foi, na adolescência, o encontro com a música. Eu tinha dois amigos cujo pai reunia regularmente a família e uns convidados para audições explicadas de Bach, Beethoven, Wagner e tutti quanti. Eu gostava muito da turma, mas não entendia uma só palavra do que ele dizia. Com freqüência, dormia no meio da audição. Um dia decidi ouvir a Quinta Sinfonia de Beethoven dez, cem, mil vezes se preciso, até decorá-la. Quando decorei, repentinamente todos os segredos da estrutura interna da composição se tornaram transparentes, mostrando sutilezas de intenção que eu jamais teria adivinhado numa audição superficial. Era todo um mundo que escapava à percepção usual, e no qual no entanto se revelava algo da ordem oculta do mundo visível. Descobri-lo era uma questão de paciência e atenção continuada apenas, mas fiquei perplexo de que ninguém entre os meus professores jamais tivesse tentado me mostrar isso antes, certamente porque nada sabiam a respeito. Mais tarde apliquei o mesmo princípio da atenção continuada à leitura de livros, ao estudo das ciências, etc. Não acredito que exista outra forma de educação possível.
A Quarta Sinfonia, regida por Von Karajan:
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